Sobre uma existência digna para o meu óleo de coco bahiano
Passei minhas últimas férias na Bahia, pouco tempo depois de ter feito a maior idiotice capilar que poderia: (tentei) descolorir meu cabelo que já acumulava milhares de camadas de tinta preta ao longo dos anos. Minha cabeça passou bons meses carregando pura palha laranja (sim, porque era óbvio que jamais daria certo).
Pois bem, na Bahia, tomada pela vergonha dos cabelos porosos, úmidos e cheios de maresia, bem como seduzida com o glamour de Trancoso e das famosas posando seus fios fantásticos para o Instagram, veio a calhar o encontro com uma guia local que contou visitar periodicamente uma aldeia indígena e trazer de lá diversos produtos medicinais para venda a turistas (alguns prometendo inclusive a cura para o câncer).
Minha maior demanda no momento era a eterna rinite (e para isso pedi um vidrinho de óleo de menta milagroso que de fato possui o poder de "destravar" o nariz com apenas algumas gotas friccionadas e inaladas diretamente das mãos).
A segunda demanda de urgência era claramente meu cabelo cor de laranja seco (qualquer um poderia afirmar isso apenas de olhar). Então comprei um segundo frasco de óleo de coco puro.
Lembro-me de ter adquirido no passado um vidrinho deste produto em uma perfumaria de São Paulo por apenas 3 reais, mas de não ter obtido muito sucesso no uso. O que me impressionou na Bahia foi o fato de que aquele óleo de coco "dormia". Sim. A guia (que tinha o cabelo mais longo e brilhante do mundo) mostrou-nos como as características puras do óleo o faziam "esbranquiçar" sob temperaturas baixas (justamente por ser extra-virgem, ele se solidifica em temperaturas abaixo de 25º, retornando à consistência da polpa do coco). Levei pra casa. Mas não sem antes ouvir atentamente as dicas de uso.
A nossa simpática guia (de verdade, dava vontade de guardar num potinho) nos aconselhou a deixar o produto agir no cabelo por algumas horas, e como sugestão, mencionou que poderíamos dormir com ele nos fios, lavando-os pela manhã.
E, à parte, mencionou também o modo como ela própria obtinha os seus resultados: "eu sempre passo antes de sair de casa quando fico o dia todo pescando em alto mar".
A partir desta colocação eu não consegui ouvir mais nada.
Ah, que qualidade de vida! Que realidade paralela surreal é essa encontrada em locais como a Bahia? Depois daquela referência a dias em alto mar, neguei-me veementemente a dar ao meu óleo de coco alguma existência indigna, quase como se estivesse desculpando-me por tê-lo tirado de Trancoso para uma vida de sofrimento nos cabelos porosos de uma paulistana que acorda às 5h30 e vai dormir 00h00 dia após dia. Não, ao meu querido óleo de coco foi prometida uma jornada que, dentro das possibilidades, remetesse ao seu primórdio no alto de um coqueiro banhado pelo sol nordestino.
É o que fiz hoje (e praticamente em todos os sábados luminosos e límpidos depois daquela viagem), quando carinhosamente aplico meu óleo de coco nos cabelos e, feliz, passo o dia lavando e estendendo minhas roupas ao sol. A minha versão paulistana de pescar em alto mar na Bahia.
0 opiniões a respeito disso :
Postar um comentário